Estudo avalia certificações técnicas para biocombustíveis destinados à aviação e especialistas dizem que falta para o segmento um certificado de sustentabilidade, que leve em consideração aspectos como o bom uso da terra, a conservação da biodiversidade e o cumprimento das legislações trabalhista e ambiental.
Já existem biocombustíveis produzidos a partir de diferentes biomassas que podem substituir o querosene usado na aviação. Muitos já têm certificação técnica e são usados em voos de demonstração e até mesmo comerciais. Mas nenhum é comercializado em grande escala e, por isso, ainda dispensa a certificação de sustentabilidade.
Realizado pelo Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), o estudo comparou as principais certificações globais para biocombustíveis existentes atualmente com o objetivo de identificar gargalos para sua implementação no Brasil, país referência mundial em biocombustíveis e com uma série de iniciativas para a produção de combustíveis "verdes" para aviação.
Financiado pela Boeing, Embraer e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o estudo analisou as certificações Bonsucro, Roundtable on Sustainable Biofuels (RBS) e International Sustainability & Carbon Certification (ISCC), de acordo com reportagem da Agência Fapesp.
"Como os biocombustíveis de aviação ainda representam um mercado muito novo, não há uma certificação de sustentabilidade com foco específico para eles. Mas as certificações atuais para biocombustíveis, em geral, provavelmente também serviriam para certificar biocombustíveis de aviação porque eles não terão grandes diferenças na produção", diz uma das autoras do estudo, Paula Moura.
De acordo com a pesquisadora, o estudo teve como foco uma tecnologia desenvolvida pela empresa norte-americana Amyris para produzir bioquerosene de aviação a partir da cana - uma das diversas opções de biomassa utilizadas para esta finalidade.
A tecnologia desenvolvida pela Amyris tem potencial de desenvolvimento em escala. Para isso, deverá requerer uma certificação de sustentabilidade. Os pesquisadores fizeram uma comparação entre os padrões adotados pelas certificações Bonsucro, RBS e ISCC de modo a avaliar os desafios com os quais a tecnologia deparará no futuro para adotá-las.
Uma das principais constatações do estudo do Icone é que os padrões de sustentabilidade das três certificações são bastante similares e se baseiam no cumprimento da legislação ambiental vigente no País e no exterior. A principal diferença entre eles está na exigência de alguns critérios adicionais, que poderão interferir na expansão e adesão pelos produtores.
Os critérios adicionais estão relacionados à Diretiva de Energia Renovável, anunciada pela União Europeia em 2010, que estabeleceu um conjunto de regras sobre como deve ser implementada a certificação de sustentabilidade da produção de biocombustíveis em geral.
De acordo com os europeus, os biocombustíveis não podem ser provenientes de áreas de floresta, de reserva ambiental, de pântanos, que possibilitem diminuir significativamente as emissões de gases de efeito estufa em comparação com os combustíveis fósseis.
Para possibilitar que os produtores brasileiros possam atender também a essas exigências externas, o Bonsucro - única certificação para biocombustíveis derivados de cana implementada no Brasil - incluiu algumas das exigências da União Europeia.
Mas, por pressão dos produtores, a certificação optou por não tratar ou abordar de forma genérica questões que ainda estão sendo discutidas e para as quais ainda não há uma metodologia bem definida para apurar o cumprimento. Entre elas estão a limitação de expansão da produção em áreas de alto valor de conservação, mudanças indiretas no uso da terra e segurança alimentar.
Como a RBS e a ISCC já adotaram alguns desses critérios, a Bonsucro seria mais fácil de ser implementada no Brasil no curto prazo, segundo o estudo. "Hoje, a maior parte dos certificados pela Bonsucro são os grandes produtores de cana, que já têm uma série de outras certificações de gestão e qualidade, mas que ainda não têm 100% da produção certificada", diz Paula.
Um dos principais desafios para expansão dessa certificação é obter a adesão de pequenos e médios produtores, que têm maior dificuldade em cumprir alguns pontos da legislação trabalhista e ambiental brasileira. A International Air Transport Association (Iata), entidade privada internacional de representação do setor de aviação, indicou a RSB como a certificação de sustentabilidade de biocombustíveis que irá adotar para os biocombustíveis que poderão ser utilizados na aviação.
A Organização Internacional de Aviação Civil (Ical), principal órgão público da aviação, ainda não definiu qual modelo de certificação de sustentabilidade de produção de biocombustíveis para aviação deverá reconhecer. Para Paula, independentemente da decisão dos órgãos internacionais de aviação, isso não inviabilizará a existência das três certificações existentes hoje. "Pode ser que os órgãos de aviação reconheçam mais de uma certificação. E a partir do momento que reconhecerem, isso exigirá um esforço das certificadoras em realizar adaptações, que dependerão muito mais deles do que da indústria de aviação", avalia a pesquisadora.
Fonte: Terra
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